Carol amamenta Elis, que nasceu em casa, em S.Bernardo |
Do Diário Regional
Seg, 09 de Julho de 2012 07:39
- Por: Aline Melo
Partos em casa somam 0,13% dos nascimentos
Deborah (de rosa, ao centro): “Humanizar é respeitar as escolhas da mulher” |
O tema ‘parto domiciliar’ tomou conta de diversas mídias, após o programa Fantástico, da TV Globo, ter exibido um vídeo que está fazendo sucesso na internet. A gravação mostra um casal de Campinas que escolheu a própria casa para a chegada do primeiro filho. No ABC, de acordo com dados do Datasus, apenas 0,13% dos nascimentos ocorridos em 2010 foram domiciliares – 49 em um total de 36.156.
Por outro lado, nos dados não é possível concluir em quais casos isso foi planejado. “Infelizmente, ainda existe muito erro na Declaração de Nascido Vivo. Então, se a mulher deu à luz em uma ambulância, a caminho do hospital, no supermercado ou mesmo no local de trabalho, muitas vezes essa informação consta como nascimento domiciliar”, esclareceu Deborah Delage, doutoranda em Saúde Pública no Departamento Materno Infantil da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) e uma das coordenadoras do Maternamente, grupo de apoio às gestantes e à maternidade ativa no ABC.
Segundo as parturientes, a falta de respeito às suas vontades quanto ao momento do nascimento é um dos principais fatores que as motivam a escolher o lar para trazer o filho ao mundo.
“Existe um grupo grande de pessoas, inconformado com o péssimo atendimento dado às gestantes, com os altos índices de cesáreas e com a falta de respeito às escolhas das mulheres, que se articula há dez anos para defender a causa”, explicou Deborah, que participou da Marcha pelo Parto em Casa na Capital paulista, no mês passado.
O movimento, que aconteceu simultaneamente em mais de 20 cidades brasileiras, foi uma resposta ao Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro, que pediu ao órgão de São Paulo punição para o médico paulista Jorge Kuhn, que apareceu na televisão defendendo o parto domiciliar para gestantes de baixo risco.
A coordenadora do Maternamente afirma que esse é o momento de aproveitar o ‘barulho’ para aumentar as discussões sobre o tema. “Fechamos 2011 com 52% de nascimentos via cesarianas. O que as escolas de medicina ensinam como atendimento humanizado é não deixar a mulher sentir dor em nenhum momento, mas isso não é humanizar. Humanizar é respeitar as escolhas da mulher”, finalizou.
Mulheres defendem experiência
A jornalista Carol Valente passou pela experiência de dar a luz em casa há pouco mais de um ano. O nascimento de sua filha, inicialmente programado para acontecer em um Centro de Parto Normal mantido pelo Sistema Único de Saúde (SUS) na Zona Leste da Capital, ocorreu em sua residência. “Combinei com uma obstetra, que conheci nas reuniões do Maternamente, que ficaria comigo até a hora de ir para o Centro, mas o trabalho de parto foi mais rápido do que esperávamos e a Elis nasceu em casa mesmo. Apesar de não ter sido como planejado, hoje entendo como a melhor opção”, afirmou a moradora de São Bernardo, reforçando que caso tenha mais um filho também optará pelo nascimento em domicílio.
Outra moradora de São Bernardo, a fonoaudióloga Aline Gerbelli aderiu a ideia na segunda gestação. “Meu primeiro filho nasceu no hospital, e apesar de ter sido um parto vaginal, fui submetida a várias intervenções, mesmo contra a minha vontade. Tomei anestesia, soro com hormônio, e nada disso estava nos meus planos. Sem falar no atendimento muito impessoal que recebi”, reclamou.
Aline contratou uma enfermeira obstetra, que foi o único profissional a assistir seu parto. “Foi completamente diferente. O respeito com que fui tratada, poder esperar a hora do nascimento sem nada para apressar. As dores foram muito menores, mesmo sem nenhum método farmacológico para controle. Fora o fato de estar perto do meu marido, do meu filho mais velho”, explicou.
“Durante o pré-natal, comentei com o médico da UBS (Unidade Básica de Saúde) que meu marido e eu havíamos optado pela Casa de Parto. Ouvi do médico que não precisava disso, que o local não contava com UTI (Unidade de Tratamento Intensivo)”, relatou Carol. “Meu sentimento foi de raiva. Não estava doente, minha filha não estava doente, não precisávamos de uma UTI”, completou. O Grupo Maternamente conta com um blog e o endereço é maternamente.blogspot.com.
O que você precisa saber sobre o assunto
O parto domiciliar é indicado para toda mulher que desejar passar por essa experiência, desde que sua gestação seja de baixo risco. “Qualquer gestante que não tenha tido durante a gravidez intercorrências que apontem para a necessidade de assistência hospitalar, de um ambiente hospitalar na hora do parto. Como intercorrências podemos citar pressão alta com conseqüente perda de proteína (identificada por exames) que podem resultar em um quadro de eclampsia ou pré-eclâmpsia; bebês muito grandes (com mais de cinco quilos) ou diabete fora de controle”, explicou Deborah Delage, doutoranda em Saúde Pública no Departamento Materno Infantil da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) e uma das coordenadoras do Maternamente, grupo de apoio às gestantes e à maternidade ativa no ABC.
Os custos são variáveis, dependendo da equipe que vai assistir ao parto. “Aqui no ABC não temos médicos da região que assistam partos domiciliares. O que a gente sabe, pelo que ouvimos as mães contarem, é que em um hospital privado uma equipe para o parto pode custar entre R$ 10 e R$ 12 mil. Para um atendimento domiciliar, já ouvi falar em R$2, em R$ 4 mil. Porém, a questão financeira não pode ser um dos motivos principais. É importante frisar que quando falamos em parto domiciliar não se trata de um evento desassistido”, destacou a coordenadora.
Segundo Deborah, existem diversas pesquisas e estudos, baseados em evidências científicas, de que não existem riscos aumentados para o parto domiciliar, sendo os mesmos possíveis para um parto normal em ambiente hospitalar. Quanto aos benefícios, são citados pelas mulheres que passaram por essa experiência a segurança de estar em um ambiente conhecido; o respeito às suas vontades por parte dos profissionais contratados e a tranquilidade de esperar as coisas acontecerem no tempo natural, sem pressa.
“Não podemos generalizar, mas o que vejo é que os médicos têm muita dificuldade em olhar o parto baseado em evidências científicas e adotar procedimentos que tiram o poder e o controle do sistema sobre o corpo da mulher”, afirmou Aline Gerbelli, fonoaudióloga e moradora de São Bernardo, que em 2009 deu à luz ao filho Pedro em sua casa, assistida por uma enfermeira obstetra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário